São Vicente: Performance de Morabezateatro leva informações sobre prevenção de abuso sexual às escolas (c/vídeo)

22-04-2024 3:23

Por Carina David (texto) e Sidneia Newton (fotos e vídeo), da Agência Inforpress

Mindelo, 22 (Abr) – O grupo Morabezateatro tem percorrido as escolas do Ensino Básico de São Vicente com a peça “Criança Cuidada”, numa iniciativa para levar informação sobre o abuso sexual, as formas de prevenir e de pedir socorro.

O desafio de alertar as crianças sobre abuso sexual infantil, através da peça, foi lançado pelo Associação das Crianças Desfavorecidas (Acrides), em conjunto com a Rede Nacional de Protecção contra a Violência Sexual e pela associação “Kreditá na bô” (Acredita em ti), do Instituto das Religiosas Adoradoras, disse à Inforpress a produtora artística do Morabezateatro, Sílvia Lima.

Para produtora que falava após actuar para crianças da Escola Mestre Baptista, no Monte Sossego, trata-se de uma forma de emponderar as crianças fornecendo-lhes informações sobre o próprio corpo, onde é que as pessoas as podem tocar ou não e o que configura as linhas de apoio que podem usar para alertar as autoridades.

“É informar as crianças as formas de se protegerem e saberem quando é que estão a sofrer um abuso ou não, e denunciar. Este é objectivo principal, já que, infelizmente, os adultos não têm conseguido protegê-las, já que algumas vezes são os próprios adultos a agredi-las, então decidi passar-lhes essas informações para ver se conseguem protegerem-se a si mesmas”, explicou.

Segundo a mesma fonte, a ideia é que crianças dos 6 aos 12 anos tenham acesso a essas informações, e a peça tem conseguido alcançar os objectivos preconizados, porque já percorreu mais de metade das escolas do Ensino Básico de São Vicente.

Para a actriz Elba Lima, que na peça interpreta “Carlitos”, uma criança travessa e irrequieto, mas bastante informada sobre violação sexual, até agora o impacto tem sido positivo junto das crianças.

“É claro que tem havido um ou outro caso em que as crianças sentem vergonha ou espanto porque não estão acostumadas ou costumam ouvir falar dessas coisas de uma forma diferente, mas o impacto é positivo. Pelo menos até ainda, em princípio, já fizemos 30 espetáculos e por onde passamos as crianças chamam-nos”, acrescentou a actriz, para quem a personagem “Carlitos” mostra precisamente que as crianças têm de estar informadas para poderem ajudar uns aos outros.

Zenaida Alfama também é outra actriz que participa na peça e utiliza uma linguagem “bastante clara” ao falar de violação sexual, dos órgãos sexuais e de outras informações sobre o tema.

“Foi o maior desafio que tivemos. Inclusive, fizemos uma pesquisa de meses para procurar uma linguagem, que não fosse muito bonitinha, mas, que nos permitisse falar de forma clara para que as crianças entendessem, porque muitas vezes sofrem por não saberem exactamente qual é o acto que estão a sofrer. Muitas vezes o violador diz que é brincadeira, mas não é. É um acto violência”, concretizou.

Segundo Zenaida Alfama, a partir do momento em que uma criança, seja menino ou menina, tem consciência clara do que é o acto sexual ela poderá perceber que se for tocado por uma pessoa no seu órgão genital ou noutra parte íntima, de forma inadequada, saberá que isso não é permitido.

“O nosso objectivo é abrir a mente das crianças. Porque, muitas vezes, elas têm o tabu de falar da vagina ou do pénis que são órgãos como se não fizessem parte do nosso corpo. E muitas vezes esse tabu é criado lá em casa”, argumentou reforçando que os pais têm que ouvir as crianças e estarem atentos para não deixarem que a violação aconteça para depois acreditar nos alertas que ela emitiu.

Corroborando as declarações de Zenaida Alfama, a produtora do Morabezateatro, Sílvia Lima, revelou que uma das coisas que constataram, durante a pesquisa para fazer a peça, é que mesmo as entidades que fazem campanha de prevenção e sensibilização sobre abuso e exploração sexual de crianças não falam abertamente sobre isso.

Pelo que, considerou, “é preciso chamar as coisas pelos nomes”.

“Como é que uma criança pode se defender se ela não sabe se o que está a sofrer é errado, mesmo que ela esteja a sentir-se desconfortável”, questionou, alertando para a necessidade de começar a transmitir essas informações no seio familiar porque “a maior parte  das agressões começam nesse meio”.

No fim de cada apresentação nas escolas, a Associação Kreditá na bô (acredite em ti, em português) entrega um questionário aos alunos cujo objectivo é recolher informações para fazer um relatório, no final do programa, e ver o que é que as crianças conseguiram apreender junto com os professores.

Segundo a responsável da Escola Mestre Baptista, Flávia Graça, a escola foi uma das que aderiu à iniciativa de receber a peça porque já registou casos de alunos que sofreram abuso sexual.

“Achei que era uma coisa importantíssima para evitar que tenhamos mais casos. Já tivemos alguns casos suspeitos e alertamos as autoridades e, por isso, quando temos esclarecido os nossos alunos, desde o 1º ano, porque crianças mais velhas da escola já sofreram abusos, mas as mais novas poderão sofrer também”, referiu a responsável.

A mesma fonte informou que a escola está sempre em contacto com o Instituto Cabo-verdiano da Criação e do Adolescente (ICCA), que já tomou parte dos casos e continuar a parceria.

“No fundo, as crianças já sabem dessas coisas, algumas, infelizmente, vêm em casa e relatam aos colegas e os colegas ao professor. E os professores, por sua vez, nos comunicam esses factos. E já temos crianças aqui a falar expressões em termos sexuais que nos deixam boquiabertos”, admitiu a mesma fonte.

No ano passado, o procurador-geral da República, Luís Landim, considerou preocupante o relato sobre a frequência de ocorrência de crimes sexuais contra crianças, salientando, neste sentido, a necessidade da criação de medidas “redobradas e enérgicas” no sentido de proteger esses “seres indefesos”.

Luís Landim que falava na abertura da Conferência Internacional intitulado “O Ministério Público e o Sistema de Proteção de Crianças em Cabo Verde”, realizada pela Procuradoria-Geral da República em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

O procurador informou que no ano judicial de 2023 foram registados 635 crimes sexuais nos serviços do Ministério Público, dos quais 302 foram crimes de abuso sexual de menores, 26 por crime de abuso sexual de menores entre os 14 e 16 anos, três por crime de sexting [troca de mensagens eróticas com ou sem fotos na internet, através de chats e redes sociais] contra menores e ainda três por prostituição de menor.

No entanto, qualquer pessoa que suspeitar de casos de abusos sexuais pode fazer uma denúncia anónima para os números 800 10 20, do Instituto Cabo-verdiano da Criança e Adolescente, ou 132, da Polícia Nacional.

A reprodução de vídeo é desativada durante o modo de edição.

 

CD/AA

Inforpress/Fim

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