Cidade da Praia, 07 Jul (Inforpress) – O analista político António Ludgero Correia disse hoje que a melhor forma de se preservar a data do Desastre de Assistência é constar dos manuais escolares para que os jovens conheçam este “triste acontecimento” que abalou o país.
“Eu acho que a melhor forma para que isso passe de geração em geração é isto [Desastre de Assistência] constar dos manuais escolares”, indicou o analista político, acrescentando que é a forma “mais segura e mais honesta de passar essa mensagem às gerações vindouras”.
Ludgero Correia fez estas considerações ao ser abordado pela Inforpress sobre a forma como o 20 de Fevereiro de 1949 deve ser recordado pelos cabo-verdianos, como o dia em que centenas de pessoas morreram, na sequência do desabamento de um barracão na localidade da Várzea de Companhia, Cidade da Praia, quando aguardavam por uma única refeição quente do dia.
Para o analista político, o Desastre de Assistência é um facto histórico “forte e determinante” que merece ser recordado, pelo que defende que este acontecimento deve fazer parte dos manuais escolares para que os miúdos o estudem.
Contrariamente a algumas opiniões, a fonte da Inforpress mostra-se avessa às cerimónias oficiais na Assembleia Nacional, com vista a se assinalar o 20 de Fevereiro de 1949, porque, justificou, “os actos do Parlamento já estão enjoando a gente”.
Entretanto, recomenda que o parlamento faça alguma coisa que marque o 20 de Fevereiro de 1949, criando, por exemplo, uma lei que possa ser denominada “Lei de Assistência Pública” ou qualquer coisa que marque essa data.
“Nós não temos esse hábito de dar nomes às leis, mas podemos fazer isso”, propõe Ludgero Correia.
Relativamente à casa parlamentar cabo-verdiana, assegura que cada um vai lá com o seu discurso, “despeja a sua bílis” que não contribui em nada para a “construção de um futuro seguro”.
Notou que actualmente muita gente já não segue os discursos dos deputados no Parlamento.
“A maior homenagem que se deve fazer a essas vítimas da fome, é que isso não se repita nunca mais”, apelou o analista.
Sublinhou que no cemitério da Várzea havia um monumento de recordação sobre o 20 de Fevereiro de 1949, além de valas comuns com marcos a lembrar o sepultamento daquelas pessoas.
“Acabaram removendo aquilo tudo, os ossos e tudo, e passaram a enterrar outras pessoas”, lamentou Ludgero Correia, acrescentando que aquilo era um monumento e que qualquer pessoa que entrasse no cemitério, perguntava e tinha informação sobre o período de Desastre de Assistência.
De acordo com Ludgero Correia, choveu em 1948 e assim podia ter sido feita colheita, mas não se fez, porque as pessoas comeram as sementes no auge da fome em 1947.
“Em 1949, as pessoas ainda estavam precisando da assistência pública para sobreviverem”, indicou.
Para ele, em vez de “discursos ocos” que se fazem no parlamento, dever-se-ia instituir o seguro colheita, a fim de se prevenir situações como a de 1949.
“Hoje, quando vamos para o interior, vimos vastas áreas de sequeiros que não são trabalhadas durante a época das azáguas”, deplorou Ludgero Correia e, segundo ele, isto faz com que o país dependa da importação de todos os cereais, até dos feijões que se pode cultivar no arquipélago.
Com a geopolítica que a gente vive neste momento, acrescenta, com oceanos minados e transportes não garantidos pode haver falhas na cadeia de abastecimento.
“Neste momento, estamos numa situação em que se falhar a cadeia de abastecimento, ficamos à fome, porque nós já praticamente não produzimos o que comemos”, pontuou Ludgero Correia.
Em seu entender, deve haver um compromisso por parte de quem quer que esteja no poder, “tudo fazer para que as sementes não falhem aos agricultores” e que estes “devem ser ressarcidos” quando não fazem a colheita depois de investirem as suas poupanças.
Na sua perspectiva, nas épocas assoladas por crise muita gente morreu porque “não havia segurança alimentar”.
Durante as fomes que assolaram o arquipélago, milhares de cabo-verdianos nunca souberam onde é que os seus entes queridos foram enterrados. Muitos corpos apodreceram nas achadas, nos covões e nas furnas à beira mar.
LC/ZS
Inforpress/Fim
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