Cidade da Praia, 23 Jul (Inforpress) - O escritor cabo-verdiano José Luiz Tavares decidiu avançar com uma queixa na Procuradoria-Geral da República (PGR) para suspender o manual do 10º ano da disciplina de Língua e Cultura Cabo-verdiana.
Em declarações à agência Inforpress, o escritor confirmou que esta quinta-feira, pelas 11 horas da manhã, apresentará participação junto do Ministério Público para intervenção na questão do manual do 10º ano da disciplina de Língua e Cultura Cabo-verdiana.
José Luiz Tavares já tinha prometido avançar para a PGR caso nada fosse feito para suspender o manual, que classificou recentemente, em declarações aos jornalistas, de “um crime contra a língua cabo-verdiana, atentado grave e uma aberração linguística”.
“Tal participação é o passo formal mais imperativo intentado até ao momento para o enterro da norma bairrista/supremacista, anticientífica e totalmente ilegal, engendrada para destruir certas variedades da língua cabo-verdiana, a começar por aquela que é a mãe de todos os crioulos desta querida terra (e até de muitas outras) sem que com isso, por serem filhos, os outros tenham menos direito de reinar também aqui”, começou por esclarecer.
Para José Luiz Tavares, tal norma, denominada de pandialetal, é "uma antinorma, dado que, recordou ‘nomos’, em grego, “é exactamente submissão à lei”
“Apesar de todos as tomadas de posições técnicas, científicas, sociais, a contestá-la e a desautorizá-la, sem que uma única voz se levantasse em sua defesa ou demonstrando a sua pertinência, foi introduzida sorrateiramente no ensino a meio deste ano lectivo, inclusive tendo sido utilizado na prova de exame do 11º ano, que ainda nem manual aprovado possui”, criticou.
Daí que, no entender do escritor, a nota emitida pelo Ministério da Educação, a “repetir as mesmas patranhas das autoras e revisoras do manual, e ainda manifestando manhosamente abertura para correções (quando não falou nem nada fez durante esses meses todos de fustigação do manual) foi apenas um mero exercício retórico para enganar o povo, ou uma brincadeira de fim de semana, até de certo mau gosto, ao repetir expressões que constituem crimes, como racismo, misoginia ou xenofobia”, que, segundo José Luiz Tavares, "as perpetrantes dessa monstruosidade anticientifica e dessa rotunda ilegalidade utilizaram em desespero de causa, quando qualquer saída razoável se lhes tinha tornado inviável”.
E prosseguiu: “A única abertura que a lei, que é soberana, deverá admitir é aquela por onde esse esquema peçonhento deverá ser atirado, e a cova onde deve ser enterrado, para não mais empestar o são convívio linguístico entre os utilizadores de todas as variedades da língua mãe desta terra”.
O poeta lançou um apelo para que todos aqueles que tenham a possibilidade de fazê-lo estejam amanhã às 11 horas em frente à Procuradoria-Geral da República, na Achada de Santo António, em “apoio a este processo jurídico e a esta causa que é também da cidadania esclarecida desta nação global, no território físico e nas suas inúmeras diásporas”.
José Luiz Tavares fez questão de realçar o “extraordinário apoio da população”, originária de todas as ilhas, que entendeu “perfeitamente bem” quando em Cabo Verde “falei a língua natural do povo destas ilhas”.
“Para além de outras pessoas, que preferem por ora não ser referidas, devo também tornar público o extraordinário apoio do Bastonário da Ordem dos advogados na elaboração da peça jurídica que amanhã quinta-feira darei entrada na Procuradoria-Geral da República, a entidade competente para conduzir o processo de salvaguarda da pluralidade dialetal da língua cabo-verdiana, considerada, por lei da NA, fundamento da soberania nacional”, reforçou.
Segundo o escritor, o pedido de tomada de decisão tem carácter de urgência, dado o recomeço das aulas a meio do mês de Setembro, e “o afã com que as mesmas perpetradoras têm posto no cozinhar do manual do 11º ano, contendo o mesmo veneno pandialetal, com a finalidade de eliminação da variante-mãe da língua do povo das ilhas, embolsando pelo meio ou pelos cantos, vá-se lá saber, uns pobres ou ricos patacos”.
José Luiz Tavares considera que, “apesar da omissão, conivência ou ausência de todos os órgãos e instâncias administrativas da soberania nacional”, designadamente a “ presidência da Assembleia Nacional, partidos políticos, por via dos Grupos Parlamentares, governo, através do Ministério da Cultura, e Presidência da República”, vai dar-lhes conhecimento da acção intentada, e ainda ao Provedor de Justiça, “a única entidade relevante” que não chegou a informei anteriormente.
Prometeu editar em Setembro, pelas edições Pretomau, numa obra conjunta intitulada «Um Crime Contra a Cabo-verdianidade», todos os textos de tomada de posição contra a “antinorma pandialetal”, junto com outros textos inéditos, mais a peça processual a ser hoje entregue.
JMV
Inforpress/fim
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