Cidade da Praia, 10 Set (Inforpress) - O artista e ex-recluso Wilson Tavares encontrou no artesanato “kabidal e magrimé” não apenas um meio de sustento, mas também um caminho de superação e reintegração social, após cumprir pena de sete anos na Cadeia Central da Praia.
Na zona da Prainha, entre cordas e linhas que se entrelaçam sobre a mesa, a Inforpress encontrou um artesão que, com mãos firmes e olhar sereno, abriu o coração para contar a sua história de vida e de superação.
“Tudo começou na prisão. Eu era jovem, tinha 17 anos quando entrei, e a arte foi o meu refúgio, a forma de me distrair e esquecer um pouco a liberdade”, contou à Inforpress.
Sem formação formal, aprendeu observando outros reclusos que produziam peças artesanais.
Primeiro ajudava a organizar os materiais, depois começou a experimentar, até descobrir que tinha talento e, sobretudo, paixão pelo artesanato.
A vida de Wilson antes da prisão estava marcada pela delinquência juvenil e pela falta de base escolar, mas foi atrás das grades que, além da arte, aprendeu a ler e a escrever, ganhando sensibilidade e disciplina.
“A arte moldou a minha pessoa. Cada vez que fazia uma peça, sentia mais amor por ela e mais vontade de me dedicar”, afirmou.
Quando saiu em liberdade, aos 24 anos, disse, não teve qualquer apoio institucional para a reintegração.
Sem mãe, sem pai e sem expectativa, guardou durante três anos o seu projecto, até decidir arriscar.
“Comecei com quatro mil escudos, comprei linha, corda e contas e fui vender à porta da Escola Secundária Cesaltina Ramos. Hoje já tenho sete anos a viver só de arte”, declarou.
O percurso não foi fácil, pois lamentou que muitas vezes enfrentou a desconfiança por ser ex-recluso, contudo, com persistência construiu o seu espaço, e hoje consegue criar peças exclusivas, inovar no artesanato e sustentar-se apenas com o seu talento.
Em épocas de maior procura, como o Verão, chega a faturar até 30 a 50 mil escudos por dia, sobretudo com turistas.
Além do sustento próprio, Wilson tornou-se uma referência para os jovens da sua comunidade.
Muitas crianças e adolescentes procuram-no para aprender a arte de fazer pulseiras e peças artesanais.
O espaço da sua casa, no entanto, já não comporta tanta gente, e por isso tem o sonho de abrir uma oficina mais ampla, que sirva como um centro de aprendizagem e de terapia criativa.
“A arte liberta, antes eu estava ansioso, agora sou calmo e paciente. Quero ter um espaço onde possa ensinar os jovens, mostrar que há alternativas à criminalidade. Seria como uma colónia de férias, onde eles poderiam aprender e ocupar as suas cabeças de forma positiva”, revelou.
O artesão deixou também uma mensagem aos que ainda estão atrás das grades.
“Peço que acreditem e foquem naquilo que realmente gostam. Enquanto não sabes no que acreditas, vais lutar por qualquer coisa. O que me salvou foi decidir o que eu queria e dedicar-me a isso”, explicou.
Agora, prepara-se para dar o próximo passo, apresentar, já no próximo mês, o seu projecto de criação de uma oficina de artesanato, acreditando que pode ser um modelo de empreendedorismo social e de reintegração juvenil em Cabo Verde.
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Inforpress/Fim
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