"Cabo Verde precisa emagrecer a máquina do Estado, redefinir prioridades e investir em quem precisa" - bispo do Mindelo

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"Cabo Verde precisa emagrecer a máquina do Estado, redefinir prioridades e investir em quem precisa" - bispo do Mindelo
17/02/25 - 02:14 pm

Mindelo, 17 Fev (Inforpress) - O bispo do Mindelo considerou hoje que Cabo Verde precisa ter uma “política séria” de pensar “quais são as prioridades da população, emagrecer a máquina do Estado e canalizar os investimentos para quem mais precisa”.

Dom Ildo Fortes teceu estas considerações em conferência de imprensa, no Mindelo, para abordar a realidade social e eclesial vivenciada junto da população de São Vicente, “sobretudo as mais carenciadas”, durante as três semanas de visita pastoral que realizou.

“Também somos um país pobre, mas temos muitas ajudas. E eu não digo só em São Vicente, mas acho que no próprio país nós precisávamos ter uma política séria de pensar quais são as prioridades da nossa população. E quando, nas visitas que faço, damos conta que há pessoas que não têm assistência a nível da saúde, que têm escolas, que não têm coisas básicas para os meninos viverem com condições, perguntamo-nos o que é que estamos a fazer”, questionou o bispo.

Dom Ildo Fortes disse que vê “muito dinheiro gasto” no País em muitas coisas, que também são precisas, mas considerou que se invista lá onde houver mais necessidades.

“Nós precisamos investir na cultura. Obviamente, um bom espectáculo faz parte, uma acumulação de alguma coisa importante. Mas a pergunta é se nós não poderíamos emagrecer um bocadinho a máquina do Estado. Porque acho que há tanta despesa gasta em representações, em coisas do género, e canalizar para quem mais precisa”, afirmou.

O bispo da Diocese do Mindelo lembrou que Cabo Verde é um país que lutou pela sua independência, porque sentia que era explorada pelos de fora, pelo que não se pode admitir que neste mesmo país “haja gente a viver bem, sumamente bem, com salários chorudos e até, às vezes, há aumentos para isso e há outros cujos salário mínimo é de miséria” e não conseguem ganhar no mês o suficiente para fazer uma viagem inter-ilhas.

“Acho que nós temos que pensar que o nosso País vive um desequilíbrio a nível da justiça social. Não tenho dúvidas nenhumas. Que áreas que precisamos investir como na saúde, na segurança das pessoas e na educação das pessoas”, argumentou.

O prelado lembrou que há 20 anos quando chegou a Cabo Verde ficou admirado quando soube que o próprio director de uma escola lhe informou que é ele mesmo é que tinha de arranjar formas de pintar a escola quando se sabe que a escola é do domínio do país.

Segundo Dom Ildo Fortes, em Cabo Verde parece ser um tabu ou um problema as pessoas falarem da fome. 

Mas, afirmou que “a fome é uma realidade” e foi constatada por ele durante uma visita a uma escola às 15:30 em que perguntou às crianças se todos já tinham almoçado e algumas disseram que não tinham almoçado e que esperavam pela refeição da escola.

“O que é isto se não passar fome? É passar a privação. Se eu não posso tomar três refeições no mínimo por dia estou em situações de carência”, afirmou a mesma fonte, para quem perante estas coisas “o povo não se indigne tanto, não se revolte tanto, mas deveria fazê-lo”.

“Às vezes mandamos bocas por aí em algumas redes, mas tínhamos de fazer manifestações sérias para nós conseguirmos aquilo que era o direito”, sustentou.

Falando particularmente de São Vicente, onde centrou a sua visita pastoral, Dom Ildo Fortes disse que o objectivo foi levar uma palavra de esperança, de conforto, de consolo àqueles que estão em situações muito difíceis. 

Mas, observou, o pão nosso cada dia nesses bairros foi encontrar a pobreza.  

“No século XXI, nestes 50 anos da nossa independência, muita gente não tem luz em casa, muita gente não tem água em casa, muita gente não tem uma casa de banho”, critico,  lembrando de uma situação que presenciou no bairro de Iraque, na Ribeira de Julião, na casa de uma pessoa que não tinha mesa e que tinha apenas uma cama e um bocado de chão onde coloca alguma panela, para fazer as suas refeições.

Para o bispo do Mindelo é preciso que todos, o Governo, as igrejas “envergonhem-se da situação que as pessoas se encontram”.

“Como é que irmãos nossos, como é que gente, como é que crianças no nosso tempo vivem assim nas situações? Por isso, mas de qualquer forma, mais do que lamentar, é levar uma palavra de esperança e de conforto a essa gente”, sustentou Ildo Fortes.

CD/AA

Inforpress/Fim

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