Cidade da Praia, 21 Out (Inforpress) – A digitalização da justiça cabo-verdiana voltou hoje a ser tema de debate durante o terceiro painel da II Jornada da Justiça, que decorreu sob o lema “Modernização, Interoperabilidade e Desafios na Era Digital”.
O debate, marcado por intervenções directas e inquietações reais, expôs tanto os avanços como as fragilidades do sistema judicial no processo de transição tecnológica.
Entre as principais preocupações levantadas, destacou-se o impacto da digitalização no direito penal.
Uma participante alertou para a “fragilidade das provas em processos digitais”, relatando situações em que julgamentos decorrem sem equipamentos adequados, o que, segundo afirmou, “pode comprometer o direito à prova e o acesso à justiça, sobretudo dos cidadãos mais vulneráveis”.
A bastonária da Ordem dos Notários, Gertrudes Moraes, por seu lado, trouxe à tona outra falha estrutural, a falta de harmonização entre os sistemas da Casa do Cidadão e das conservatórias.
“Temos duas instituições com formas de trabalhar totalmente diferentes. Seria importante adoptar o mesmo sistema da Casa do Cidadão, que tem demonstrado maior eficiência”, sugeriu.
Gertrudes aproveitou ainda para denunciar constrangimentos enfrentados por advogados em alguns cartórios, defendendo que o mandato forense deve permitir a prática de actos notariais, conforme previsto no estatuto da classe.
O bastonário da Ordem dos Advogados, Rui Araújo, reforçou a necessidade de equilíbrio entre celeridade processual e respeito pelos direitos de defesa.
“A rapidez não pode atropelar a justiça. Ainda temos tribunais, sobretudo no interior, onde a digitalização simplesmente não funciona”, lamentou.
O jurista português Jorge Costa levou o debate a outro patamar, questionando os limites do uso da inteligência artificial nas decisões judiciais.
“Julgar é um acto humano. A máquina pode ajudar a encontrar elementos, mas não pode substituir a consciência de um juiz”, frisou, lembrando que Portugal já aprovou uma Carta dos Direitos Digitais para regular essa nova era.
Na mesma linha, o advogado Danilo de Martins defendeu que o país precisa garantir a segurança do sistema e prever soluções alternativas para eventuais falhas.
“A tecnologia é o caminho, mas precisamos do plano B e até do plano C. A digitalização não pode ser sinónimo de vulnerabilidade”, alertou.
O painel encerrou com a entrega simbólica dos certificados do primeiro curso de Inteligência Artificial para Operadores de Justiça, dirigido a magistrados, procuradores, conservadores, notários e técnicos de informática, como parte do Fórum Justiça e Cidadania.
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Inforpress/Fim
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