Cidade da Praia, 14 Mar (Inforpress) – Celebram-se hoje 35 anos desde que um grupo de cidadãos, opositores ao regime monopartidário em Cabo Verde, pôs a circular pelo país inteiro e pela emigração a Declaração Política do MpD, que marcou a história do arquipélago.
O cientista político Daniel dos Santos, um dos subscritores da referida Declaração Política, diz que se trata de um documento que, na época, “marcou a história, cumprindo-a, pela ousadia, sensatez e ideias modernas que continha, em contraponto às do partido único, de si anacrónicas”.
“Tratou-se, em substância, de um inovador documento que fundou, de facto, o MpD, embora de jure este não pudesse existir por força do famigerado e celebérrimo artigo 4.º da Constituição autoritária de 1980, que impedia que os cabo-verdianos criassem partidos políticos em pé de igualdade com o PAICV”, afirmou Daniel dos Santos, em declaração à Inforpress.
Segundo ele, mesmo assim, o MpD não aguardou pela supressão, em Setembro de 1990, do tal artigo para se afirmar como partido político.
“Pelo contrário, fez-se muito cedo às ruas, a ponto de, em menos de um mês, ter conseguido que a Declaração Política, que inspirou a boa Constituição democrática de 1992, fosse assinada por cerca de 600 cabo-verdianos, tanto no país quanto na emigração”, indicou o comentador político, para quem o número de assinaturas recolhidas expressa a “enorme simpatia” que o documento granjeou, em pouco tempo, junto da sociedade civil, “uma proeza digna de referência e a registar nos anais da história de Cabo Verde, sob qualquer ângulo de abordagem”.
O manifesto do MpD, sublinha Daniel dos Santos, “feito a duras penas”, constituiu uma resposta à abertura política, “anunciada com pompa e circunstância pelo PAICV a 19 de Fevereiro de 1990”.
Na sua perspectiva, o 19 de Fevereiro é uma data que “não deve ser menorizada porque abriu portas para a liberalização e a consequente democratização do país, em resultado dos
acordos entre os partidos, o tal pacto de regime que viabilizou com transparência e sucesso a transição política, que, a bem dizer, desembocou no 13 de Janeiro, data maior”.
“O PAICV, com a chamada abertura política, não pretendia instituir a democracia em Cabo Verde”, apontou, acrescentando que o partido da estrela negra “desejava apenas liberalizar a ditadura de partido único em ordem a perpetuar-se no poder, criando um espaço mínimo de contestação política que permitisse o surgimento de grupos de cidadãos, ideia a que o MpD se opôs denodadamente por não corresponder aos anseios e expectativas do povo cabo-verdiano”.
No fundo, relevou, o PAICV tinha em mente implantar, em substituição do partido único, o “autoritarismo competitivo ou eleitoral – um regime político híbrido, suportado por um sistema partidário hegemónico, que combinasse elementos democráticos com autoritários”.
“Em boa hora, o MpD opôs-se-lhe, assumindo que o regime autoritário não era passível de aperfeiçoamento, mas de urgente substituição, sabido que se tornou, sempre o foi desde 1975, «contraproducente e historicamente ultrapassado» e, mais do que isso, infenso ao pluralismo idiossincrático dos cabo-verdianos”, lembra dos Santos.
Segundo ele, o consenso que prevaleceu nas negociações de então levou o MpD a convencer o PAICV que o caminho a seguir era o da democratização de Cabo Verde, não havendo em alternativa outro qualquer, quanto mais não fosse porque “o espírito da época que imperava no mundo era o da mudança e estava em rota de colisão com os regimes autocráticos, autoritários e totalitários.
LC/ZS
Inforpress/Fim
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