
***Por Sandra Custódio, da Agência Inforpress ***
Cidade da Praia, 26 Set (Inforpress) – A professora Hermínia Curado, tida como uma “mulher especial”, gosta de ter sempre coisas para fazer, e enquanto tiver vida e saúde quer continuar a ser útil ao país e ver Cabo Verde avançar cada vez mais.
“Enquanto eu tiver alguma saúde e puder, farei sempre isso. Gostaria de continuar a ser uma pessoa útil na sociedade. Porque eu não posso estar sem fazer nada. Tenho de ajudar, trabalhar, quero ver o meu país avançar cada vez mais”, manifestou.
Esta é a aspiração de Hermínia Gomes da Cruz Curado Ferreira, de nome próprio, ou simplesmente Dona Mimi como é carinhosamente tratada, expressa durante uma conversa tranquila à Inforpress, onde discorreu sobre o seu percurso de vida, desde a sua infância, juventude, trazendo à memória boas recordações, dando a conhecer o outro lado da pessoa, enquanto mulher e ser humano.
Dona Mimi, que se considera uma pessoa “muito especial e querida”, tem um vasto currículo em áreas diversas da cidadania, foi responsável pelas Relações Exteriores na Associação de Escritores Cabo-verdianos (AEC), professora de Português.
Deputada Nacional, secretária da Mesa da Assembleia Nacional, presidente da Rede de Mulheres Parlamentares, presidente da Assembleia Geral da Sociedade Cabo-Verdiana de Autores (SOCA) e da Associação Cabo-verdiana para a Proteção da Família (VERDEFAM).
Também, conselheira do Instituto Cabo-verdiano para a Igualdade e Equidade de Género (ICIEG), faz voluntariado na área social e cultural, entre várias outras coisas.
Filha de mãe natural de São Vicente e pai português, Dona Mimi, que foi criada pela madrasta Maria Isabel, a quem chama de mãezinha, nasceu em São Vicente e veio com o pai, José Curado, “chefe da Polícia” para a cidade da Praia tinha ela 04 anos.
Tendo em conta a função do progenitor, andava sempre de um lado para o outro, vivendo em várias ilhas do país.
Fez os estudos primários e secundários entre Praia e São Vicente, e tinha 14 anos quando veio “de vez” para a Praia, estudar “para o liceu, na altura a antiga Casa Cervantes, e inaugurou o liceu Adriano Moreira, na década de 1960, agora Liceu Domingos Ramos, onde também leccionou.
É a primeira das seis irmãs, Suzy, Magui, Helena, Dina e a Paula, filhas da madrasta Maria Isabel, que tem hoje 94 anos e vive em Portugal.
Lembrando alguns episódios da sua infância, que disse ter sido muito feliz na Rua Serpa Pinto, Hermínia Curado conta que sempre quis ser professora, tanto assim é que, aos seus dez anos, punha bancos e cadeiras à volta, para as irmãs sentarem e ela dar aula.
Ainda embalada nas suas memórias, lembra-se de à noitinha, tomar fresco à beira da porta, sob os olhares da avó Dondinha, jogava ao ringue com outras amigas, ouvia histórias contadas pelas senhoras mais velhas, ia à praça brincar e ouvir música, principalmente aos domingos… bons tempos, conforme recorda.
Mãe de três filhos, dois rapazes e uma menina, os quais deram-lhe cinco netos, meninas e rapazes, a sua alegria, Dona Mimi que também já é bisavó, foi casada durante muito tempo, mais de 30 anos, com António Pedro, Tonecas, o único homem da sua vida, tendo ficado, entretanto, viúva nova, com a morte de repente do marido, em 1999.
Casou-se por procuração e foi para Guiné, onde se encontrava o marido, da Guiné foram para Angola, e quando se deu a Independência regressaram ao país.
Recordando a história amorosa dos dois, conta que os seus pais eram amigos, então os pais dele, disseram-lhe que quando chegasse à Praia, fosse cumprimentar a Dona Isabela e o senhor Curado.
Assim fez o Tonecas, e chegado lá à casa onde vivia a Dona Hermínia, apaixonou-se logo por ela, a mulher de baixa estatura e de pele morena.
“Ele ia para a Holanda, mas desistiu da viagem. Regressou à Guiné-Bissau, e ficamos a namorar durante dois anos por procuração. De 63 a 65. Casámos depois em 65 por procuração. Foi assim”, reviveu.
“Ele era uma pessoa que não sentia nada de especial, um desportista nato. Mas, naquele dia, saí para ir dar aulas, chamaram-me que o meu marido se sentia mal e tinha de ir para o hospital. De repente, foi a tensão arterial que subiu… sem nada. Nunca mais pensei em casar. Dediquei-me apenas aos meus filhos”, recordou, com visível nostalgia.
Aceitando essa dura realidade conta que a primeira coisa que fez a princípio, foi tirar todas as suas roupas de cores vivas do guarda-fato e pôs numa mala, como se nunca mais as vestisse.
“Senti muito a falta dele porque apoiava-me muito, por exemplo, a nível da política entre outras decisões e escolhas. Dava-me força. Quando fui eleita deputada, em 2001, ele já não estava cá para ver”, lamentou, considerando-se, apesar dos pesares, uma mulher feliz porque tem os seus filhos, netos, bisnetas e as suas irmãs.
“Somos uma família muito unida. Fui professora, e é também uma alegria quando me encontro com os meus alunos, hoje feitos homens e mulheres, fazem-me miminhos. Muita gente que hoje está no Governo ou a trabalhar noutros sítios foram meus alunos. É gratificante”, manifestou, lembrando que sempre acarinhou e auxiliou os alunos que mais precisavam, tanto a nível de medicamentos, alimentação ou outras situações.
Dona Mimi guarda também boas recordações da casa dos avós em Rui Vaz, interior de Santiago, onde ia passar férias.
“Era uma felicidade, gostava de estar lá, comer as coisas que a minha avó fazia… era uma alegria só”, recordou.
Dona Mimi, que se alegra em saber e sentir que as pessoas gostam dela, independentemente dos seus ideais e convicções, denota que há uma “grande diferença” entre o fazer política agora e antigamente.
“Há muita diferença. Às vezes noto que na política há muitas discussões, até de ódio. Deixa uma pessoa triste. A democracia está em nós”, comentou a mulher multifacetada, desempenhando inúmeros papéis na sociedade moderna, sido também atriz com 12 anos, em São Vicente, daí essa paixão pelo cinema, escritora, com alguns livros publicados e co-autora de outros, devendo dar à estampa, mas ainda sine die, o livro infantil intitulado “A Máscara”.
Aos 81 anos, mantendo-se ainda um espírito jovem, reformada como deputada desde 2011, Dona Mimi conta que não foi fácil conciliar a sua vida profissional, política, familiar, e ainda por cima sem o seu marido, tendo, entretanto, contado sempre com a ajuda das suas irmãs, as quais estima muito.
Quanto à sua vida social, disse que é relativamente activa, tem amigos, amigas, muita gente à sua volta, sai para lanchar, almoçar ou jantar fora, além dos “momentos bons” com a família, que “é enorme”, cada um com seus filhos e netos.
“Se juntarmos todos… E de vez em quando vamos ver a nossa mãe, em Portugal, a mãezinha que vai fazer 94 anos no dia 8 de Novembro. Tenho uma vida social relativamente activa porque gosto de estar com pessoas. Nasci para estar com pessoas”, exteriorizou.
Nisto, gosta de cozinhar, mas não como obrigação, e há pratos que gosta de fazer, por exemplo, o seu empadão de mandioca com atum que “ficou célebre” e sempre faz nos convívios lá em casa.
Nesta idade da vida disse ter tudo o que uma mulher desejaria ter, especialmente, filhos, plantado árvores e escrito livros, pelo que gostaria de ter saúde para continuar a ser útil, escrever e dedicar-se à leitura.
SC/JMV
Inforpress/Fim
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