*** Por Sandra Custódio, da Agência Inforpress ***
Cidade da Praia, 10 Set (Inforpress) - Teresa Mascarenhas, uma mulher guerreira por natureza, muito reservada e sensível às causas sociais, quer ainda, aos 65 anos, aprender a tocar violão, piano e artes plásticas.
Oriunda de uma família muito humilde e religiosa, pai camponês, mãe doméstica e costureira, progenitores de 14 filhos, 05 meninas e 09 rapazes, Teresa Mascarenhas, que se considera uma mulher reservada, de luta, tem dedicado a sua vida às causas sociais.
Tanto assim é, criou a Associação das Famílias e Amigos de Crianças com Paralisia Cerebral (Acarinhar), a primeira instituição no país dedicada à melhoria das condições de vida de crianças com paralisia cerebral.
Possui formação técnica e profissional na área das Ciências Sociais e é licenciada em Fisioterapia aplicada à reabilitação de crianças com paralisia cerebral.
A sua trajectória destaca-se como um exemplo de dedicação e sua resiliência diante aos desafios reflecte sua paixão pela profissão, contribuindo sobremaneira para a promoção da igualdade e inclusão das pessoas com deficiência no país.
Casada há 42 anos, com o primeiro e único homem da sua vida, mãe de três filhos, dois rapazes e uma menina, Maria Teresa Mascarenhas Santos Pina, ou simplesmente, Teresa Mascarenhas, é uma mulher incomum, batalhadora e guerreira.
Nasceu no interior da ilha Santiago, em São Lourenço dos Órgãos, onde viveu uma infância feliz, mas na escola não tinha materiais didácticos como as de outras crianças, cujos familiares enviavam do estrangeiro, então ficava à espreita, esperando um momento para pedir uma caneta de feltro emprestado para colorir os desenhos no seu caderno.
Foi crescendo ali em São Lourenço dos Órgãos, devido à influência religiosa quis fazer parte das missionárias daquela comunidade, mas desviou-se desse caminho, arranjou o seu namorado, tendo casado aos 22 anos com o marido que até agora estão juntos, nessa longa caminhada de vida a dois.
Desde muito cedo desenvolveu essa vocação de lidar com a infância porque gostava muito de ajudar as crianças, principalmente as com algumas dificuldades ou deficiências, assim como a mãe que também gosta de ajudar o próximo.
Tendo isso como desígnio, apareceu-lhe uma oportunidade e foi fazer o curso de animador especial em Portugal, e a partir dos 20 anos começou a trabalhar nessa área, em São Lourenço dos Órgãos, durante oito anos.
Entretanto, depois de casada e com o nascimento dos filhos, veio para a Praia em 1998, passando a residir nesta cidade até agora, com vista a uma melhor educação e qualidade de vida dos seus meninos, hoje feitos homens e mulher.
Nunca foi de festas, baile, discotecas ou de visitar amigas, pelo que passou a sua juventude mais em actividades da igreja que lhe dava gozo porque de muita aprendizagem, e como casou-se muito jovem, dedicava seu tempo às lides e cuidados da casa.
“Nunca fui uma pessoa de ter muitos amigos e amigas. Não sou tanto de estar a visitar as pessoas, sair de casa… sou uma pessoa muito reservada e caseira. Quando não tinha nada para fazer, preferia ver um livro sobre culinária ou deitar-me. Dedicava-me muito aos trabalhos domésticos”, conta.
“A minha formação religiosa serviu-me e de que maneira como base, transformou-me na mulher que eu sou, enquanto pessoa, mãe, esposa, profissional, e sensível aos problemas dos outros. Mas, muitas das vezes sinto-me impotente perante situações difíceis das pessoas e sofro com isso”, exteriorizou.
Hoje, prestes a completar 65 anos, embora com algumas mágoas e decepções, Teresa Mascarenhas diz-se satisfeita com a vida, e antes de morrer quer aprender a tocar violão, piano e artes plásticas.
“Meu sonho: quero aprender a tocar violão, piano e artes plásticas. Quero pintar um quadro bem grande para os meus netos e bisnetos se lembrarem de mim”, manifestou Teresa Mascarenhas que já tem cinco netos.
Quando completou 60 anos fez a sua primeira festa de aniversário com muita alegria, agora não vai ter festa, vai brindar na tranquilidade com o marido e os filhos, aguardando os 70 anos para outra festa rija.
Segundo Teresa Mascarenhas conciliar a vida profissional com a familiar é uma tarefa difícil, que implica muita ginástica para não causar aborrecimentos, uma vez que a presença materna é fundamental no lar.
“É preciso fazer muita ginástica. A nossa casa também precisa de nós, mas enquanto estiver acordada estou a trabalhar neste projecto. Então, conciliar essas duas coisas é muito complicado. Muitas vezes prejudicamos a própria família em detrimento dos projectos sociais. Mas o projecto social é muito importante, faz parte de mim. Traz-me muita, muita felicidade poder ajudar quem mais precisa”, confessou.
Reformada há 10 anos, a presidente da Acarinhar, um projecto sem muitos recursos e com muitas demandas, disse que é nesta condição que o seu trabalho como voluntária começou, porque a trabalhar mais de 10/12 horas por dia, sempre a correr de um lado para o outro.
“Não tive a sorte de ter recursos próprios para colocar à disposição desta camada. Gostaria de poder edificar um grande centro de dia para apoiar as crianças durante o dia onde teriam todas as condições, desde alimentação adequada, equipamentos apropriados a especialistas em determinadas áreas”, lamentou, ciente que é um desejo que não vai poder realizar.
Quanto aos tempos livres disse que são “super ocupados” (risos) porque sempre está focada nos projectos sociais e nas crianças com paralisia cerebral.
Entretanto, gosta de cozinhar, confecciona vários pratos, mas não estar na panela como rotina nem fazer as lides de casa como obrigação.
“A minha mãe ensinou-nos a fazer tudo que uma mulher deve fazer e dizia que quem quer ter marido e mantê-lo, tem que cuidar da casa, fazer um bom prato, lavar a roupa, passar a ferro, entre outros afazeres domésticos”, comentou.
Tereza Mascarenhas aproveita o momento e exorta a juventude a não ter pressa na vida, porque tudo acontece a seu tempo.
“Quando temos muita pressa em fazer as coisas, podemos perder grandes oportunidades. É preciso ir devagar. Porque as coisas acontecem a seu tempo”, aconselhou.
Referindo-se também às mulheres, a mesma fonte aconselha a ter “muita paciência” e apostar no seu empoderamento.
“Porque ninguém vem nos empoderar. Temos de ser nós próprias donas de nós mesmas, e chegar aonde quisermos com tranquilidade”, finalizou.
SC/JMV
Inforpress/Fim
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