Independência/50 Anos: Cabo Verde progrediu no trânsito mas falha na cultura da  segurança rodoviárias, dizem especialistas (c/vídeo)

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Independência/50 Anos: Cabo Verde progrediu no trânsito mas falha na cultura da  segurança rodoviárias, dizem especialistas (c/vídeo)
06/08/25 - 03:00 am

Cidade da Praia, 06 Ago (Inforpress) - Cabo Verde tem registado um aumento nos acidentes de viação, especialmente na Praia, e os especialistas apontam a falta de cultura de segurança rodoviária, ressaltando a necessidade urgente de fortalecer a fiscalização, a educação e a sinalização das vias.

O crescimento acelerado do número de veículos em Cabo Verde tem trazido avanços nas estradas e na tecnologia dos automóveis, mas também expõe desafios críticos na segurança rodoviária, agravados com um aumento preocupante de acidentes, especialmente na Cidade da Praia.

Nos últimos anos, Cabo Verde tem registado um crescimento significativo no número de veículos, juntamente com avanços na pavimentação das estradas e na modernização da frota, no entanto, esse progresso expõe novos desafios relacionados à segurança rodoviária, principalmente em relação à educação dos condutores e à fiscalização das regras de trânsito.

O director e proprietário da Escola de Condução Prevenção Rodoviária, José Gonçalves Júnior, conhecido por Joe Gonçalves, destaca que, apesar da pavimentação de mais de 1.200 km de estradas desde 2000, “o número de acidentes também aumentou, devido à falha na cultura de segurança rodoviária”.

O director apontou ainda as principais causas dos  acidentes como o excesso de velocidade, ultrapassagens perigosas, álcool ao volante e o uso abusivo do telemóvel que gera distração.

“Em Cabo Verde, a educação rodoviária praticamente não existia até pouco tempo. Estamos atrasados, sim, e a situação exige que se trabalhe com urgência na formação dos condutores e na conscientização da população”, explica Gonçalves, ressaltando que, “perdemos em média 54 vidas por ano nas estradas, já teve anos que chegamos a centena (...), salvo erro 139 num só ano, mais há anos que vamos até 30”. 

“O impacto humano é o que mais preocupa, além das perdas de vidas, há o custo social, Qual o preço para uma criança órfã? Para um pai que perde um filho jovem? Esses custos não aparecem em estatísticas, mas são imensos”, lembrou Gonçalves, enfatizando que quase 100% dos acidentes são causados por erro humano.

O responsável aponta o “uso abusivo do telemóvel” entre as principais causas recentes que vem agravando o problema. 

Já para o director da Escola Boa Formação, Samuel Lopes Morais,  a educação rodoviária é uma das maiores carências actuais. Morais reforçou a importância de inserir programas educativos mais intensos nas escolas, desde a educação básica, para formar condutores e pedestres mais conscientes.

“O jovem cresce acostumado com veículos circulando por todos os lados como se fossem parte da paisagem, e isso reduz a prudência e a percepção de risco. É fundamental inserir a educação de trânsito no currículo escolar, desde o ensino básico, para formar condutores e pedestres mais conscientes”, analisou.

Nas ruas da cidade da Praia, a situação das estradas é motivo constante de reclamação, de que é exemplo o taxista Wilson Semedo, que vive o dia a dia do trânsito, pelo que relatou o abandono das vias públicas, onde buracos e a falta de sinalização adequada tornam a circulação perigosa para todos.

“Tem buracos, falta sinalização adequada, e quando começam obras, não colocam placas de alerta. Isso só aumenta o risco de acidentes, além de danificar os nossos veículos”, afirmou. 

Citou um episódio recente em Achada São Filipe, onde a construção de uma lombada sem sinalização causou um acidente a um dos seus colegas.

Essa estrada, lembrou Gonçalves, é um exemplo emblemático do problema estrutural que a segurança rodoviária enfrenta, apesar de ser uma via larga, de boa visibilidade e em linha recta, é a mais mortífera do país. 

“O Código da Estrada não prevê lombas, precisamos actualizar nossa legislação e infraestrutura. Hoje, lombas não são suficientes para controlar a velocidade de carros modernos que podem atingir 100 km/h em poucos segundos. O uso de radares é essencial para punir os infratores de forma eficaz”, apontou.

Além disso, Gonçalves destacou um problema quase invisível na sinalização de trânsito mal padronizada. 

“Temos sinais copiados do Código da Estrada português e europeu, o que é bom para manter a validade internacional das nossas cartas, mas existem sinais importados de países que não seguem o nosso regulamento, criando confusão para os condutores. Isso é perigoso e pode até eximir o infrator da responsabilidade em caso de acidente”, explica.

Samuel Morais também enfatizou que a fiscalização, embora presente, necessita ser ampliada com mais agentes e equipamentos tecnológicos, como radares, e mostrou-se expectante pela aprovação de uma nova legislação rodoviária, incluindo a introdução da carta por pontos, que deve contribuir para a redução das infracções e acidentes.

Semedo também alegou que os taxistas estão a cumprir os seus deveres, mas, no entanto, estão sem os seus direitos.

“Pagamos impostos caros, incluindo o imposto de circulação, mas rodamos em estradas esburacadas e malcuidadas, que desgastam nossos veículos e aumentam os riscos de acidentes. Precisamos de mais vias alternativas para desafogar o trânsito, principalmente nas áreas urbanas”, reivindicou Semedo.

Um outro ponto crítico é a manutenção das estradas. Gonçalves chamou a atenção para vias que não recebem reparos há décadas, o que provoca “sabonização”, quando a camada asfáltica se perde, tornando a pista escorregadia, especialmente nas chuvas. 

Esse fenômeno “eleva o risco de aquaplanagem e acidentes graves, sobretudo para motociclistas e ciclistas”, explicou.

A situação, realçou, exige uma resposta urgente do governo e dos órgãos responsáveis, mas mostrou-se crítico com o Plano Nacional de Segurança Rodoviária, criado para mitigar essas tragédias, mas que “tem orçamento inferior a 2 milhões de euros muito aquém do impacto econômico dos acidentes, que ultrapassa 10 milhões de euros anuais”.  

Para Gonçalves, “não podemos continuar a perder vidas e recursos desse jeito, sabendo que quase todos os acidentes são evitáveis.

É preciso união de esforços para implementar o plano, reforçar a educação, modernizar a infraestrutura e aprimorar a fiscalização, uma vez que a “segurança rodoviária é uma questão de saúde pública, de dignidade e de futuro para Cabo Verde”.

CG\SR/JMV

Inforpress Fim

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