*** Por Letícia Neves, da Agência Inforpress ***
Mindelo, 03 Set (Inforpress) – A arte da sapataria acompanha a família Gomes há quatro gerações e até conquistou os mais novos, Jéssica e Jacileida, que prometem levar o negócio adiante, modernizar, e o ajustar às suas áreas de formação superior.
O cheiro a cola e couro, mas também impressões sobre consertos e confecção de sapatos são algumas das coisas que Jorge Gomes e as suas filhas, Jéssica e Jacileida, partilham no dia-a-dia, trabalhando juntos na Sapataria JArte, situada em pleno coração do Mindelo, atrás do antigo Salão Gia.
Tudo isso porque as duas jovens, de 25 e 21 anos, respectivamente, são as ajudantes do pai, que trabalha no ramo desde os 16 anos, com os ensinamentos passados também pelo seu pai, de um ofício existente na família desde o bisavô.
Com os primeiros passos dados em casa, Jorge Gomes, como contou à Inforpress, enriqueceu depois os seus conhecimentos como empregado de duas fábricas de calçado, em São Vicente, o Socal e a Growela, as duas já extintas.
“Conheci dois tipos de fabrico, um artesanal e outro industrial”, explicou o “aventureiro” que, em 1996, decidiu caminhar pelas próprias pernas e abrir em sua residência, na zona de Ribeirinha, a sua primeira sapataria.
Depois os caminhos, em 2014, o levariam à Morada (centro da cidade do Mindelo), à procura de um público maior, e onde terminou por ter como colaboradoras as duas filhas, suas ajudantes no horário contrário ao das aulas e que preencheram a “falta de mão-de-obra consciente e responsável” de que se queixava.
“Decidi as ensinar a profissão para terem como alternativa de vida, pode até não ser o futuro delas, mas vão sempre tê-lo presente”, justificou Jorge Gomes, que mesmo aos 55 anos agradece ter aprendido muito com o pai “Raul Sapateiro”, considerado “um dos melhores de São Vicente” e que confeccionou os primeiros sapatos ao cantor Bana, para este conseguir viajar para o estrangeiro.
E pelos vistos, este legado não vai ficar pelo caminho, a deduzir pelas palavras da filha mais nova, Jacileida Gomes, de 21 anos.
Na adolescência aprendeu os primeiros toques de sapataria com a mãe, que também aprendera com o marido Jorge Gomes. Passou a experimentar nas suas próprias coisas, já que “é inadmissível que uma filha de sapateiro não saiba consertar os próprios sapatos”.
As férias escolares serviam para aprimorar os conhecimentos na sapataria e ainda conseguir algum dinheiro para as suas necessidades, inclusive comprar os óculos para a sua miopia, que o pai não estava a conseguir dar só com o seu rendimento.
Hoje pronta para frequentar o 4º ano do curso de Línguas e Relações Empresariais, divide o tempo entre a universidade e a oficina, que também lhe abre horizontes para aquilo que quer ser no futuro, uma empreendedora.
“Quero ter a minha própria empresa, ainda não sei qual ramo, porque também adoro desenhar e tinha o sonho de ser designer de moda, mas a sapataria não está descartada”, assegurou a jovem.
Quem também não se queixa de estar imersa no mundo de consertos de calçados, sapatos feitos à medida e todo o universo de confeccção de artigos até para o Carnaval é a outra filha, Jéssica Gomes, de 25 anos.
Começou aos 11 anos e por iniciativa própria, quando num belo dia decidiu terminar um conserto que a mãe tinha deixado pelo meio para fazer o almoço.
“A partir daí nunca mais parei, mas comecei logo nas encomendas de clientes e depois fui me aperfeiçoando”, disse a jovem sapateira, que agora faz os seus próprios sapatos de raiz, coze, pinta, costumiza calçados, bolsas e vários outros artigos, sem muitas dificuldades.
Aliás, como garantiu, a ideia é expandir o negócio, formando outras pessoas no ramo e ainda, quem sabe, conciliar com a sua formação em Criminologia, completa no ano passado.
Ou seja, usar a sapataria a favor da lei.
“Porque, na hora que um indivíduo está focado em algo, não tem mente aberta para fazer nada ilícito, não há tempo para vandalismo, seria uma grande coisa”, argumentou Jéssica Gomes, que complementa essa vantagem com o facto da sapataria, tal como é agora, permitir conhecer uma diversidade de pessoas e abrir algumas possibilidades.
Mas, o certo é que ver o negócio continuado e modernizado pelas filhas daria “muito orgulho” a Jorge Gomes, que além de sapateiro, tem outro talento, o de compositor, com músicas registadas na Sociedade Cabo-verdiana de Música e interpretadas por cantores cabo-verdianos como Rosa Mestre e Djim Job.
LN/JMV
Inforpress/Fim
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