Tarrafal, 02 Out (Inforpress) – Nelito Tavares e Carlos Varela, “homens do mar” do município de Santiago, estão preocupados com os impactos das mudanças climáticas nas suas actividades diárias.
Estes dois homens, além de pescadores, são mergulhadores, empreendedores na área do turismo, promovem excursões turísticos em botes tradicionais no mar do Tarrafal, dizem-se sentir os efeitos das mudanças climáticas, confirmando que é algo que todos os colegas no município enfrentam, mas que também é uma situação vivida por toda a classe, independentemente de onde actua no país.
Em contacto com pescadores de várias comunidades do país, Nelito e Carlos relatam que a informação que têm é que “a diminuição da quantidade de peixe e a presença de correntes de água fria e quente em locais próximos têm afectado suas fainas, tornando a pesca cada vez mais desafiadora”.
Apesar de sentirem na pele os efeitos dessas mudanças, tanto Nelito quanto Carlos afirmam que não possuem formação ou informações adequadas sobre as alterações climáticas.
“A maioria de nós não sabe o que são, quais são as causas e consequências, e não entende que se trata de um fenómeno global”, explica Nelito.
Ele também destaca a falta de conhecimento sobre as espécies protegidas, como tartarugas e tubarões, e a importância de cada uma no ecossistema marinho.
Neste sentido, os pescadores solicitam apoio das entidades competentes para obter capacitação sobre o que acontece no mar, os tamanhos adequados dos peixes a serem capturados e informações sobre as espécies. “Sem esse conhecimento, corremos o risco de prejudicar o ecossistema marítimo”, alerta Nelito.
Actualmente, a escassez de peixe em Cabo Verde é uma r”ealidade alarmante”, admitem os pescadores, notando que, embora a situação possa ser atribuída às mudanças climáticas, também há a influência do Acordo com a União Europeia, que permite a pesca com barcos maiores nas águas de Cabo Verde.
“Antigamente, com remo, era possível capturar grandes quantidades de peixe em menos de duas milhas. Hoje, mesmo com motor, às vezes nem conseguimos 10 quilos”, lamenta Nelito.
Nelito lembra que existem 75 comunidades pesqueiras em Cabo Verde e todas apresentam reclamações similares, pois, a classe se sente “abandonada e carece de mais apoio”.
Embora tenham recebido botes e motores, os pescadores ressaltam que a capacitação em novas tecnologias é igualmente essencial.
No seu caso, contou que possui equipamentos como GPS e sondas, e acredita que instrumentos do tipo também poderiam beneficiar seus colegas.
Além disso, os pescadores mencionam a dificuldade em organizar cooperativas e desenvolver projetos para obtenção de apoios, porque muitas vezes esses projectos, quando submetidos para financiamentos, acabam “adormecidos em banho-maria”.
“Eu participei em uma formação em 2019 sobre empreendedorismo azul, tenho um plano de negócio, procurei financiamentos, pedi empréstimo nos bancos comerciais, mas até esta data nada”, disse o Nelito, mostrando assim alguns dos entraves que deixam os pescadores com pé atrás quando pensam em criar cooperativas e projectos.
Diante das dificuldades, Nelito e Carlos dizem permanecer “esperançados” de que, com mais informações e capacitação, os pescadores poderão enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas e garantir a sustentabilidade de suas actividades.
As mudanças climáticas estão causando uma série de impactos significativos na pesca em todo o mundo. Essas alterações, decorrentes do aumento das temperaturas globais, da acidificação dos oceanos e de eventos climáticos extremos, estão afectando tanto a vida marinha quanto as comunidades que dependem da pesca para sua subsistência.
Cabo Verde, um país insular extremamente vulnerável às mudanças climáticas, tem visto a pesca, sector essencial para sua economia e segurança alimentar, ser fortemente impactada.
Um estudo do projecto Adaptação das Políticas de Pesca às Mudanças Climáticas na África Ocidental APPECCAO em Cabo Verde revelou que o aumento da temperatura da água, a acidificação dos oceanos e a mudança nos padrões de migração dos peixes estão reduzindo as capturas e prejudicando a renda e a segurança alimentar das comunidades pesqueiras.
MC/JMV
Inforpress/Fim
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