***Por: Sandra Custódio, da Agência Inforpress***
Cidade da Praia, 12 Ago (Inforpress) – A jurista e consultora internacional Cristina Fontes Lima define-se como uma pessoa de muito entusiasmo, que gosta de conviver e conversar, mas detesta falta de respeito e relações em que as pessoas tratam outras por “parvas”.
Cristina Fontes Lima, que é também mestre em Administração Pública, foi um dos mais proeminentes membros dos governos do PAICV, liderado pelo primeiro-ministro, na altura, José Maria Neves, actual Presidente da República, tendo sido ministra da Justiça, da Administração Interna, da Presidência do Conselho de Ministros, da Reforma do Estado e da Defesa Nacional e ministra Adjunta e da Saúde.
Foi o único membro do Governo que durou 15 anos com José Maria Neves na governação do país.
De nome completo Cristina Lopes de Almeida Fontes Lima formou-se em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e em 1996 concluiu um mestrado em Administração Pública pela Southern Illinois University.
Nesta entrevista à Inforpress, no Hotel Praia Mar, sítio de que gosta muito, num desabafo descontraído, entre algumas risadas, fala um pouco sobre si, com muito entusiasmo das coisas boas e menos boas, porque a vida é assim mesmo.
Filha de pai de Santa Catarina e mãe de São Vicente, avós paternos do Fogo e avós maternos de São Nicolau, Cristina Fontes Lima nasceu na maternidade do Hospital da Praia em 1958, há 67 anos, e disse que conserva até hoje a fotografia da mãe a sair com ela daquele espaço.
Na sua infância, lembra-se de ser bastante “mimada e querida” rodeada dos pais, dos seus avós, tios e tias, na casa familiar, um sobrado em Assomada, Santa Catarina, um espaço de família que lhe acolheu sempre, proporcionando-lhe uma infância feliz.
Viveu a adolescência em Angola para onde, nos anos 70, os pais que eram funcionários dos Correios e como tal andavam um pouco com a “casa às costas”, foram trabalhar, crescendo também com a família presente e com um culto de “djunta mom”, (unidade), tendo herdado, conforme asseverou, esta ideia de “grande união familiar”.
Naquele país africano Cristina Fontes despertou muito cedo o interesse para a política pois, com 14/15 anos, Luanda permitiu-lhe ter toda a experiência de uma sociedade não só de opressão, mas também de ebulição, com a guerra em várias zonas de Angola.
Então, nessa idade, começa a fazer perguntas sobre as desigualdades, situações de exploração do angolano autóctone, português a tirar o cinto e a bater no empregado, entre outras situações que achava que não fazia sentido e isso despertou nela alguma revolta e para a necessidade de lutar por causas, coisas mais justas e um mundo melhor.
Cristina Fontes que tem uma mistura de “badio e sampadjudo”, faz a vida em Cabo Verde até os 09 anos, pelas ilhas de Santiago, São Vicente e Fogo, com uma vivência também na diáspora, quando lhe perguntam de onde é que ela é, responde que de Cabo Verde por inteiro.
Com todas essas andanças, conta que sempre teve a convicção de que viria fixar-se em Cabo Verde, e em 1975 teve o privilégio de vir para o país assistir a Independência Nacional, estar no Estádio da Várzea e presenciar emocionada o hastear da bandeira, tendo decidido que regressaria, porque andava à procura um pouco da sua identidade, embora tivesse a mundividência cabo-verdiana em casa.
Entretanto, com a guerra em Luanda, os pais decidem voltar para Portugal onde, em Lisboa, fez a Faculdade de Direito, determinada que voltaria para Cabo Verde, quando terminasse o curso, o que veio acontecer em 1982.
Foi a primeira jurista do Ministério dos Negócios Estrangeiros, com pouca experiência, mas determinada a ajudar, onde fez um percurso de quase 14 anos de diplomacia, mas nunca entrou para a carreira diplomática, preferindo ficar na área técnica, porque gostava de Direito… e foi assim que começou o seu percurso aqui no país.
Oriunda de uma família de funcionários públicos, Cristina Fontes, que é a primeira dos sete filhos, quatro meninas e três rapazes, disse terem levado uma vida simples, com muita consciência do sacrifício e entreajuda.
Dos momentos difíceis fala da perda “muito prematura” dos pais, ambos com 63 anos, o pai em 1987, com um cancro, a mãe em 1992, a morte do irmão mais velho, a seguir a ela, e do desafio da doença mental, de pessoas na família com bipolaridade.
“Nos desafiaram imenso, mas fizeram-nos mais fortes, a gente vira mais humano. Essa parte da minha vida foi de muita aprendizagem, todos nós tivemos de assumir essa situação e apoiar uns aos outros. Aprende-se, efectivamente, que na vida a gente tem de estar preparada para o que acontecer”, exteriorizou.
Casada com o diplomata Tony Lima, há 34 anos, mas entre namoro e estar juntos já perdeu a conta, Cristina Fontes é mãe de dois filhos, uma menina de 33 anos, que já lhe deu uma neta, e um rapaz de 28 anos que também traz “muita felicidade”.
“Eu agora sou avó e é um ciclo maravilhoso. De manhã tomo conta da minha neta, ajudo a minha filha”, manifestou.
Interessante é que Cristina Fontes Lima, cuja vida foi “andar com a casa às costas, aqui e acolá, quando entra no Ministério dos Negócios Estrangeiros evita a carreira diplomática, uma carreira que lhe ia fazer de novo andar de casa às costas, acaba por casar-se com um diplomata (risos), e vivido no Togo por cinco anos, cuja experiência, conforme disse, foi interessante.
“Sou casada com uma pessoa que, também, acabou por ter um percurso como eu. Encontramo-nos nestas causas, mas também na maneira como olhamos o mundo, a sensibilidade, a simplicidade das coisas, o gostar de estar com as pessoas… tem sido um casamento com dificuldades, porque as relações nunca são fáceis, mas o amor e a comunhão de objectivos têm ajudado e estamos já com 34 anos de casados, um percurso de muita partilha”, relatou.
Antes do Tony Lima tinha um apaixonado que queria casar com ela, mas dizia que não tinha essa intenção, porque queria fazer várias coisas, ter seu espaço e o casamento podia anular os seus objectivos.
Essa mesma pessoa, que conhecia bem o ministério para onde ela foi trabalhar, pressagiou que haveria ali “muitos galifões” a correr atrás dela, a conquistá-la, a começar pelo Tony Lima (risos).
“Na verdade, quando nos conhecemos não me impressionei logo. Fomos para a Índia em missão e aí descubro, de facto, uma pessoa com bastante competência, capacidade… ele estava encarregado de mim, de me enquadrar porque era a primeira vez que eu ia assistir a uma reunião na diplomacia e acabo por ficar bem impressionada pela prestação dele”, conta.
“Mas ele estava à partida riscado da minha lista de pretendentes, porque o outro não podia ter razão de que ele seria um dos que poderiam querer me conquistar”, relata entre gargalhadas como que a reviver o momento.
Cristina Fontes que tem grande paixão pelo direito constitucional, se assume como política, tendo tido o privilégio e a responsabilidade de governar o país durante 15 anos, se define uma pessoa com muito entusiasmo, dá graças a Deus pela “grande vitalidade e energia”.
“Dou graças a Deus a cada manhã. Gosto de fazer coisas. Acordo de manhã com projectos, gosto de conviver, conversar, apoiar os outros, mas também de me sentir realizada”, manifestou Cristina Fontes que agora, na reforma, acha-se num ritmo mais brando e gostaria de voltar ao direito constitucional.
Para além de política, a ex-governante, que não se considera uma pessoa de nariz empinado, gosta de decorar a casa, lidar com plantas, cozinhar, gosta de ver e fazer receitas, tendo inclinação para a gastronomia africana, coisas mais simples e saudáveis, usar especiarias, mas não dispensa uma boa cachupa, feijoada, bacalhau com broa, chicharro grelhado com legumes, entre outras comidas.
Quanto à sua vida social, disse não ter muitos, mas bons amigos para sair, gosta de uma boa festa, dançar, se divertir, conviver em casa e passear com a família em Santa Catarina e Tarrafal.
SC/HF
Inforpress/Fim
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