Cidade da Praia, 04 Fev (Inforpress). Do momento do diagnóstico ao tratamento, as quedas de cabelo e a retirada de um dos seios fazem parte da imensa luta travada por Sandra Barros e Osvaldina Cardoso, que vivem momentos de incertezas contra um inimigo silencioso e mortal.
Em comum, além do combate contra o câncer de mama, está a vontade de viver e a sabedoria de quem aprendeu com as dificuldades e que a cada dia celebram mais a vida. Duas mulheres amigas e guerreiras, que representam a força e a garra da mulher cabo-verdiana.
Sandra Barros, uma jovem de 34 anos, mãe de uma filha de três anos, vive com a família no bairro de Tira Chapéu, subúrbio da cidade da Praia. Descobriu o câncer de mama no final de 2021, após as primeiras consultas no Hospital Agostinho Neto. Esta jovem, que trabalha como segurança privada, sentiu os sintomas quando ainda amamentava a filha que na altura tinha apenas um ano e sete meses de vida.
“Nem foi um caroço, na altura era um quadrado em um dos seios, o tempo de ir às consultas era difícil devido ao horário de trabalho. Então fui deixando o tempo passar, e coincidiu que a minha mãe estava em consultas devido a problemas de saúde”, lembra à Inforpress a jovem que esperou três meses para procurar um atendimento médico.
Era Outubro, lá estava Sandra no Centro de Saúde do bairro, depois de fortes dores no seio e no braço. Fez a primeira consulta e foi-lhe solicitado exames de ecografia. Ao longo desse processo, as dores intensificaram e alastraram por todo o corpo, que pensava estar relacionada com a amamentação. Quando descobriu que se tratava de um câncer, começou o “desespero”, o “medo” e por último a “negação”.
Com os resultados da ecografia foi-lhe pedido um exame de biópsia e os seios aumentaram de tamanho, começando até a libertar sangue.
“Foi um desespero, o meu mundo escureceu, o meu primeiro pensamento foi na morte, ainda mais quando se é mãe, foi um turbilhão de sentimentos e medo, então tomei a iniciativa de informar a minha família”, lembra.
No dia em que a filha completaria dois anos de idade, teve o diagnóstico de câncer e de metástase no fígado nível IV, e decidiu que não se entregaria à doença e a encararia com coragem. Não foi fácil o tratamento, “é longo e pesado”, mas necessário, defende Sandra.
“Disse para a doutora, qual o próximo passo, ela respondeu, vamos fazer mais um exame de sangue, e no três de Dezembro começamos o tratamento da quimioterapia, foram nove meses intensos e não foi fácil, é nessas horas que ganhamos força, fé, coragem e esperança”, disse.
Como o tratamento mais “agressivo”, a quimioterapia é feita num intervalo de 21 dias e utiliza medicamentos que misturados ao sangue são levados por toda partes do corpo, destruindo as células doentes e impedindo que se espalhem. É nesta fase que ocorrem as quedas de cabelo e outros sintomas como vómitos e falta de apetite.
Esta mãe, um exemplo de superação, disse que o apoio da família é a maior força, mas que esta luta não é só dela, mas do mundo inteiro que a acompanha. Hoje, permanece em tratamento médico e incentiva outras mulheres a procurarem ajuda.
“Eu encontrei ajuda também em outras guerreiras, que não tiveram o apoio da família, hoje temos um grupo de apoio ´Divas Guerreiras de Cabo Verde´. Outra força veio dos vídeos de humor que faço no Tik Tok”, testemunhou Sandra, com mais de três mil seguidores e 55 mil “curtidas” na sua conta da rede social.
Superar é a meta diária de Osvaldina Cardoso ou carinhosamente chamada de “mãe”. Com três filhos adolescentes, descobriu o câncer em 19 de Maio de 2018, como bem lembra. Os primeiros sinais à semelhança da Sandra, conta, foram dores e manchas vermelhas no seio.
Osvaldina suspeitava de um câncer de mama e recorreu a uma amiga que também teve esta doença, para confirmar a hipótese, que mais tarde daria lugar a um diagnóstico médico.
“Só pensava na morte, a morte não deveria ser o primeiro pensamento, mas com superação e muita luta podemos vencer”, sublinhou, relatando que preferiu lutar sozinha, inicialmente, com os filhos.
Com um salário mínimo de 13 mil escudos, como empregada doméstica, os custos com o tratamento foram “dolorosos”.
“É com este que pago as rendas, a alimentação, despesas com os filhos, exames, consultas, notei que não conseguia suprir com as despesas e procurei ajuda na família”, relata.
“Descobri, lutei, venci e agradeço a Deus”, afirmou Osvaldina, com quatro anos de tratamento e livre do câncer, e que em Dezembro completa cinco anos da retirada de um dos seios. Fez seis meses de tratamento de quimioterapia no país, e de radioterapia em Portugal.
Considera uma “vitoriosa” que lutou numa fase difícil e que encontrou a força que precisava nos filhos. Consultas médicas e exames ainda estão na sua rotina, num intervalo de um ano, que começa em Fevereiro, mas diz que manter o pensamento positivo e o “bom humor” são fundamentais.
Os desafios na luta contra o Cancro em Cabo Verde vinculam-se, informou o vice-presidente da Associação Cabo-verdiana de Luta contra o Cancro, Benvindo Lopes, a sensibilização e consciencialização da população para a importância da prevenção e diagnóstico precoce do cancro.
“Temos três tipologias que temos de focar: o cancro de mama, próstata e colo uterino. E quando falamos da prevenção é em forma geral, sobre educar e passar as informações aos cabo-verdianos”, enfatizou este responsável que reiterou a importância da alimentação equilibrada e actividade física.
A ingestão abusiva de bebidas alcoólicas e tabagismo são dois dos factores que influenciam o aparecimento desta doença, adiantou.
Como ratificou, continuam as resistências dos homens no rastreamento e diagnóstico precoce do câncer de próstata.
“Começamos as nossas actividades em Janeiro com o rastreio nos amputados no Centro Nacional Ortopédico e de Reabilitação Funcional (CENORF), porque o nosso foco é atingir as pessoas deficientes ou que apresentam algumas limitações”, explicou, acrescentando que durante esse ano vigoram as actividades de rastreio com deslocações para as ilhas do Fogo e Brava, em parceria com as Delegacias de Saúde e as câmaras municipais, para além das deslocações para os municípios do Santiago Norte.
“Este ano, queremos uma abrangência mais forte, com acompanhamento e tratamentos psicológicos e não só, dos pacientes oncológicos. Por isso, mobilizamos parceiros nacionais e internacionais para ajudar”, reiterou, completando que este acompanhamento é destinado também aos pacientes oriundos de outras ilhas.
Garante que com essas deslocações tem quebrado o “tabu”, incentivando pessoas a realizarem o rastreio precoce de cancro.
Segundo o médico, têm constatado que a maioria dos casos são diagnosticados numa fase avançada, o que constitui uma preocupação “séria” porque a resposta ao tratamento ou a possibilidade de cura diminui.
Por isso, apela à população, principalmente aos homens, a procurarem os serviços de saúde com antecedência e a conversarem com os médicos sobre o tratamento contra o cancro.
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Inforpress/Fim