***Por:Aidé Veiga, da Agência Inforpress***
Cidade da Praia, 10 Set (Inforpress) – O abandono escolar no ensino superior continua a ser um problema que afecta as instituições, o sistema e a sociedade cabo-verdiana sendo que o fraco rendimento das famílias é a principal causa de desistência.
Nas vésperas do arranque de mais um ano lectivo, a Inforpress quis saber junto das universidades e institutos privados as perspectivas e desafios, e constatou unanimidade em como a questão do financiamento e o fraco recurso das famílias continua a ser uma preocupação a nível nacional e motivo das desistências.
Segundo avançou o director dos Serviços Académicos da Universidade de Santiago, (US) Lamine Tavares, nos últimos três anos cerca de 400 estudantes desistiram, mas com tendência decrescente sendo que 240 estudantes são referentes ao ano lectivo 2020/21, 110 ao 2021/22 e menos de 50 no último ano lectivo.
Explicou que essas desistências estão relacionadas com anulações, trancamento de matrículas, mobilidade e com o facto de que muitos estudantes se matriculam, mas nunca chegam a ingressar na universidade.
Para Lamine Tavares, que é também coordenador do curso de Engenharia Informática, o fraco rendimento das famílias tem sido o grande motivo para o abandono escolar nas instituições de ensino superior.
“Se pensarmos na Universidade de Santiago em que a sede está na Cidade de Assomada, Santiago Norte, onde as famílias têm um poder financeiro menor, aliado às sucessivas secas desde 2014 o rendimento das famílias que vivem no campo tem diminuído o que tem causado ainda mais dificuldades”, sublinhou.
O coordenador disse que o polo na Cidade da Praia está a crescer, mas o forte das dificuldades centra-se em Santiago Norte onde as famílias têm um poder de compra menor.
Entretanto adiantou que neste momento dispõem de uma série de medidas para dar respostas a essas situações, mas sublinhou que deveria haver um forte incentivo do Estado, sobretudo, para as universidades privadas poderem suportar um pouco mais as dificuldades que as famílias têm tido, através do financiamento de programas de investigação que dão suporte a determinadas despesas que as universidades fazem.
“Estamos a conseguir manter melhor os estudantes na Universidade de Santiago, mas efectivamente a universidade tem feito um esforço “tremendo ” para poder manter todas as suas políticas sociais em acção, sendo que temos investido a nível do desporto, social, temos comparticipação a nível da alimentação, transportes com pagamento das propinas”, apontou.
Por seu turno, a administradora geral da Universidade Lusófona, Filomena Martins sublinhou que se trata de uma realidade que trespassa todas as instituições de ensino superior no País e que se prende com razões que já são conhecidas, que é o insuficiente rendimento do estudante ou das famílias para as despesas essenciais.
“Nós temos uma forte expansão do ensino superior no País, particularmente entre 2001 a 2008. Nesses sete anos surgiram sete instituições de ensino superior no País, portanto, esta expansão deveria ter levado os Governos a repensarem a questão da sustentabilidade e do financiamento do ensino superior”, salientou.
Acrescentou que uma outra causa flagrante é que mais de 20% dos estudantes que obtêm vagas para estudar no exterior desistem, porque não têm condições financeiras para fazer face a essas despesas.
Defendeu que é necessário reconfigurar as políticas públicas para o ensino superior com medidas e acções concretas como a criação de uma linha de crédito em condições específicas, junto à banca, em que o estudante poderá fazer o seu empréstimo e o Estado entraria como avalista.
Outra possibilidade que também está sobre a mesa, particularmente desde 2019, é a criação de um fundo que teria exactamente os mesmos contornos, através do qual o estudante poderia aceder a recursos financeiros para a sua formação.
Este fundo, ou linha de crédito, teria de estar definida, alinhavada, de modo a que pudesse garantir esse financiamento, mas com mecanismos que permitissem aos estudantes receberem o fundo e, posteriormente, reembolsá-lo na íntegra.
Entretanto adiantou que, neste momento, a taxa de desistência ronda os 20 a 25%, mais ou menos a média nacional, porque a situação é a mesma praticamente em todas as instituições.
Por outro lado, a directora dos Serviços Administrativos e Auxiliares da Uni-Piaget, Emília Monteiro Tavares, revelou que uma média de 150 estudantes desistem anualmente e que nos últimos três anos os cursos de Arquitectura, Engenharia de Sistemas de Informática e Psicologia tem predominado.
Esta responsável partilha da opinião de que a questão financeira é o principal motivo para o abandono escolar.
“Muitas vezes os estudantes matriculam-se e candidatam ao financiamento para os estudos e não conseguem, o outro é a oferta formativa no estrangeiro, mais concretamente em Portugal em que muitos se matriculam para poderem conseguir um visto para fora de País, após conseguirem o visto suspendem a matrícula”, apontou.
Para Emília Monteiro, é necessário implementar melhores políticas de incentivo aos jovens que lhes permitam valorizar o ensino superior no País, fazer uma distribuição mais igualitária dos estudantes pelas diversas instituições do País e uma melhor distribuição de quadros qualificados pelas mesmas instituições permitindo que todas tenham profissionais de qualidade.
Por outro lado, defende ainda que o Estado devia fazer um melhor investimento a nível financeiro, tecnológico e de mentoria para que as instituições privadas possam competir em pé de igualdade com as instituições estrangeiras e com isso evitar a fuga de estudantes.
De acordo com os dados da Agência Reguladora do Ensino Superior (ARES) referente ao ano lectivo 2022/23, 9.193 alunos estão inscritos no ensino superior.
AV/HF
Inforpress/Fim